sábado, 29 de dezembro de 2018

PARA ALÉM DA ESTAÇÃO


Tão bonita
A tua presença,
Linha tênue, 
Algodão.

Nosso abraço
Urgente,
Lucidez das horas
Intermináveis.

Te esperei,
Quase desencontro
De estações.

Te vejo, pois,
Na janela do amanhecer,
Azul indelével.

Recebo-te,
E não fosses espera;
Recebo-te,
Relógio de sol,
Para além dos nossos verões.

elmo.


quarta-feira, 5 de dezembro de 2018

CRIATURAS

Carrego o preço da vida. Esforço em vão. Desanimei, não posso mais sorrir. Desanimei pela angústia do cerco que me traduz. Pretensioso porvir, por que te afastas de mim? Por que não podes sonhar em nome da nossa geração? Por que te acenam, mundo cruel? Oráculo cinza, obscuro e fatídico. Eis o que restou da nossa geração. Única e nunca mais. Incerta época atrás, o falso profeta, Masoch, preconizou: "Não precisai despertar, pois já vos ofereço o chapéu e todas as dores do mundo!". A dor, primitiva e abduzida. E como receita mística de patrocínio. A minha culpa é ter apreço, como quem cria da criatura; o meu pecado foi não ter estendido uma mão abestalhada, em plena luz do dia...

       E.W.R.

quinta-feira, 29 de novembro de 2018

A VIDA DECORRENTE DOS SARAUS

Depois de tanto tempo de estudo, entendi que precisava ter um pouco mais de conhecimento do que supostamente já sabia. Por isto estou aqui. Tentando aprender a dinâmica, a vida que existe nos saraus da cidade de São Paulo - um verdadeiro fenômeno mundial, esse tipo de  manifesto literário-musical, nesta urbe. Gosto deveras do movimento, da participação coletiva. Não se trata somente de quantidade - e há récitas em todos os  30 dias do mês. Mais de um até. Falo da importância cultural, da arte popular que resiste e ousa existir, apesar desses tempos bárbaros. E aqui mesmo surgiu a ideia de lançar um sarau em Porto Alegre, com base nestas experiências que estou imerso. Essa coisa de mesclar literatura e música é ancestral, a própria poesia se espalhou desta forma, através dos menestréis, na Europa antiga. Recordo com muita saudade do famoso sarau da Dona Maria, que ficava no centro histórico da capital gaúcha. E quem me levava lá era o grande agitador cultural e poeta, Nelson Fachinelli, diretamente responsável por lançar mais de mil poetas brasileiros, pelas centenas de coletâneas que organizava. Eu mesmo participei de uma três ou quatro. Lembro bem deste grande amigo pessoal, que quando falei da possibilidade de publicar o meu primeiro livro individual, ele, com a sua grandeza peculiar, insistia em me arrastar pelos saraus de Porto Alegre, os mais "cults", inclusive. Recém-chegado do interior, eu ficava ao seu lado, ainda que de forma tímida. Então, longa vida a esta forma de expressão popular e cultural!

São Paulo, dezembro de 2018

                          Elmo Wyse Rodrigues

domingo, 28 de outubro de 2018


E continuamos na estrada, com vários projetos, tentando levar por onde conseguirmos andar, Literatura & Música - e sem concessões.



Corsários Acústicos no Estúdio 785, São Paulo, bairro Pinheiros (SP). Esta música entrará no terceiro CD, que será gravado totalmente acústico, cujas gravações iniciarão em Sáo Paulo ,em dezembro próximo. A ideia é lançar um vinil e um CD. Sendo que o vinil será de um lado CORSÁRIOS DO PARQUE e  o outro lado CORSÁRIOS ACÚSTICOS.

#corsáriosacústicosnaestrada


Corsários Acústicos no Estúdio 785, dos brothers  Marcelo e Eduardo - local onde vamos lançar o segundo CD, em sua segunda edição, na Caverna 785.

#corsáriosacústicosnaestrada

quarta-feira, 24 de outubro de 2018

O QUE CHAMAM DE TARDE...

O sol explodia o rosto. Acordei ao sul, extremo sul. Sem norte nem devaneios. Tomei o café costumeiro. Pão dormente mastigo. Alguém dormiu? Não eu. Nada de mais, nada de mal. A vizinha de novo bateu a janela. Bem na minha cara. Sol no rosto, vizinha na cara, desejo na pele. Mas hoje é dia. Mais um dia. De madrugada, semana passada, ouvi alguém uivar: os dias são todos iguais!... Eu ando achando, tola vidinha eu ando achando. Apressado e  cansado, sem ruptura nas ruas. É só ritual. Nada de menos. O todo do dia, neste quarto de hotel, anotei num diário, uma fração a mais.  Bairro a bairro, eu penso no mundo e quem pode mudá-lo - talvez de lugar. Ou da minha sala. Quem faz sentido, o que faz sentido nessa rotação? Com quem conversar? O elevador por andar me escuta. De concreto, poucas ruas vaguei. Há uma longa jornada. Depois te conto. Antes vou consumir a tinta da ribalta.  Um bilhete amassado. Camisa passada. Um pé na estrada. Outro amassando a pedra. O vento assovia. Amigo na esquina. Não tropeça no pé, meio-fio! Não faz notícia da queda. Eu só caio na estrada. Não preciso de lenço, Caetano. A garganta esgana. A cidade neblina o nobre ácido: de tão denso sobe em pó. Quem labuta nas cinzas, bem sabe: tudo que emana é calada manhã. Calma, soldado. Quem ousa das vielas gritar?  Sim, o silêncio é arte, Susan Sontag. O troco da fibra, se raspa e resmunga, é veia partida; invade e vaga a voz do porão. Um pé na estrada. Não posso parar. Se penso é tarde. Quando chega a tarde roda mesmice no filme das horas.  Rugas e olhos virados miram a noite do dia. Por que chamam de tarde o que está por nascer? Desde pequeno acreditei, o pescador recolhia na rede e guardava o tempo que sobrava no mar. Desaparecia nas luzes: coragem e luar. Hoje sobra no bolso o metal que me cobra o custo da vida. Quando acordo, é estranho, sou espelho de um tempo a velas. Ninguém apagou. Não há personagem que fale por si. Havia soldados de verde. Desses não quero lembrar. Quanto vale a saudade de um pai, um ideal que se foi? O futuro ficou. Ao olhar o presente rasgo rito e um terno; só não tenho o direito de fazer a leitura como se fosse a esperança  um excêntrico inverno. Amargo e chumbo. Parto a memória, laço e novelo. Mas não vira herói quem tortura sementes. Enquanto turvo a vidraça, passa uma geração. Se penso que é tarde, não posso parar. Se me debruço na chuva, outros são girassóis. O cio da navalha afia a vertente, apura e gira o fio das ideias.  Escuta a via, rapaz. Abre o verbo e vem ver o corte da ordem. Deixa eu dormir acordado. O dia é longo, e fala por si.




O QUE CHAMAM DE TARDE...

O sol explodia o rosto. Acordei ao sul, extremo sul. Sem norte nem devaneios. Tomei o café costumeiro. Pão dormente mastigo. Alguém dormiu? Não eu. Nada de mais, nada de mal. A vizinha de novo bateu a janela. Bem na minha cara. Sol no rosto, vizinha na cara, desejo na pele. Mas hoje é dia. Mais um dia. De madrugada, semana passada, ouvi alguém uivar: os dias são todos iguais!... Eu ando achando, tola vidinha eu ando achando. Apressado e  cansado, sem ruptura nas ruas. É só ritual. Nada de menos. O todo do dia, neste quarto de hotel, anotei num diário, uma fração a mais.  Bairro a bairro, eu penso no mundo e quem pode mudá-lo - talvez de lugar. Ou da minha sala. Quem faz sentido, o que faz sentido nessa rotação? Com quem conversar? O elevador por andar me escuta. De concreto, poucas ruas vaguei. Há uma longa jornada. Depois te conto. Antes vou consumir a tinta da ribalta.  Um bilhete amassado. Camisa passada. Um pé na estrada. Outro amassando a pedra. O vento assovia. Amigo na esquina. Não tropeça no pé, meio-fio! Não faz notícia da queda. Eu só caio na estrada. Não preciso de lenço, Caetano. A garganta esgana. A cidade neblina o nobre ácido: de tão denso sobe em pó. Quem labuta nas cinzas, bem sabe: tudo que emana é calada manhã. Calma, soldado. Quem ousa das vielas gritar?  Sim, o silêncio é arte, Susan Sontag. O troco da fibra, se raspa e resmunga, é veia partida; invade e vaga a voz do porão. Um pé na estrada. Não posso parar. Se penso é tarde. Quando chega a tarde roda mesmice no filme das horas.  Rugas e olhos virados miram a noite do dia. Por que chamam de tarde o que está por nascer? Desde pequeno acreditei, o pescador recolhia na rede e guardava o tempo que sobrava no mar. Desaparecia nas luzes: coragem e luar. Hoje sobra no bolso o metal que me cobra o custo da vida. Quando acordo, é estranho, sou espelho de um tempo a velas. Ninguém apagou. Não há personagem que fale por si. Havia soldados de verde. Desses não quero lembrar. Quanto vale a saudade de um pai, um ideal que se foi? O futuro ficou. Ao olhar o presente rasgo rito e um terno; só não tenho o direito de fazer a leitura como se fosse a esperança  um excêntrico inverno. Amargo e chumbo. Parto a memória, laço e novelo. Mas não vira herói quem tortura sementes. Enquanto turvo a vidraça, passa uma geração. Se penso que é tarde, não posso parar. Se me debruço na chuva, outros são girassóis. O cio da navalha afia a vertente, apura e gira o fio das ideias.  Escuta a via, rapaz. Abre o verbo e vem ver o corte da ordem. Deixa eu dormir acordado. O dia é longo, e fala por si.

Elmo Wyse Rodrigues



sexta-feira, 5 de outubro de 2018

CORSÁRIOS ACÚSTICOS DESEMBARCAM EM SÃO PAULO


Corsários Acústicos chegam nesta capital para lançar  o livro de poesias e prosas poéticas, NOTURNO VERBAL, do autor Elmo Wyse Rodrigues - poeta do extremo sul do país. O projeto encantador chega em pocket show e no formato acústico, pois a dupla integra uma banda de blues, rocks & baladas.  Formação: Cristiano de Oliveira: voz & violão; Elmo Wyse Rodrigues: voz & harmônica. NOTURNO teve excelente repercussão em cidades gaúchas, como Porto Alegre, Rio Grande, Pelotas. E também une poesia e música, dentro de uma coletânea do poeta existencialista Elmo, que já publicou FUGA Nº3, com edição esgotada. Cristiano & Elmo são fundadores dos CORSÁRIOS DO PARQUE, banda que existe desde os anos 1990, com dois CDs e shows importantes em teatros e espaços culturais no Rio Grande do Sul, como o Araújo Vianna e o Teatro de Câmara. E vão levar esse projeto para o Rio, Curitiba, Florianópolis e Fortaleza.  A produção é da paulistana Isis Vargas.

#corsáriosacústicosnaestrada

segunda-feira, 1 de outubro de 2018



                  QUARTO 518 E UM SOL DE BANHEIRA PARA AQUECER A LUCIDEZ


Perto de perder o sonho, ganhei olhar pela janela. Quarto 518,  mais um número desconhecido. Pássaros e ônibus já disputavam os primeiros ecos difusos do alvorecer. Caminhei até o arroz integral, com sal do Himalaia. Espero ter protegido a receita budista no refrigerador. Quatro horas. Oh, inferno estas batidas do soturno relógio; berram na parede.  Estranho por estranho, coloco um Frank Zappa na vitrola, baixinho. Repousa pouco a bela vizinha, faz residência médica. Resolvi ficar na cozinha. Por aqui envio-lhes esta inútil carta insone. Na mesa de refeições, o segundo livro semanal dos republicanos espanhóis. Franco, cai fora. Estou a poucos metros da pequena varanda. Ademais, cercado de automóveis, vidraças & aviões. Estou só. A poucos centímetros desta angústia perene. Ela  me queima em turbilhão. Mas disseram que amanhã não verei nuvens, e sim um sol de banheira aquecendo a lucidez. Sussurram luzes na sacada alheia. É permitido voar, em calmaria. Me tranco em suspiros, supondo dormir.

                      Outubro de 2018

                         E.W.R.

sexta-feira, 28 de setembro de 2018

BELA, MACIA, VESTIDA


E foi cobrindo teu vestido nu
Que toquei teus seios
Absurdamente belos
No côncavo das minhas mãos.

E foi pelo teu vestido nu
Que grudei o calor em linhas,
o teu corpo na parede,
em grafite,  beco do batman.

E foi colando teu vestido nu
Que experimentamos o êxtase, 
silenciosamente a dois, a sós, 
dois corpos falando,
roupas úmidas coloridas.

E.W.R.

quarta-feira, 12 de setembro de 2018

A MALDIÇÃO DE MONTEZUMA

Ah, não dá, não pra mim. Virada disso, dobradinha daquilo, carne seca em todos os pratos. Não mesmo!...rsrs. Molho pra mim é alho, cebola e pimentão verde. Pronto. Ah, quando a comida está pronta, claro, tempero verde e azeite de oliva. Mas pelo jeito são bem aceitos pela burguesia esses pratos exóticos. Não, a partir de amanhã, vou fazer a minha própria comida. Ainda bem que já fiz o meu estoque de alcachofra. O pessoal aqui no bairro é muito educado, atencioso. Um tratamento generoso e exemplar. E acham muito engraçado o sotaque...rsrs. Sigamos!

Elmo in Corsários Acústicos na Estrada

A Vila Madalena é como um dia de carnaval. Digamos: meio carnaval, meio Cidade Baixa. Bem bacana. É...como diria Bob Dylan - " It's all right ma, I'm only bleeding".

Elmo in Corsários ACÚSTICOS NA ESTRADA

segunda-feira, 3 de setembro de 2018

LIBERDADE AMADA

LIBERDADE AMADA
VOU SAIR POR AÍ
SEM CARREGAR TEUS FARÓIS
NEM ME ABRIGAR DA NEBLINA

UNTEI AS MÃOS DE ESPERANÇA
ENGOMEI O MEU ÚLTIMO TERNO

LIBERDADE AMARGA
O QUE FIZERAM CONTIGO?
IMPLODIRAM TUA VOZ
COM VIOLÊNCIA E SOBERBA

LIBERDADE AMARGA
LIBERDADE AMADA
SEGURA TEUS NERVOS
MATARAM, TORTURARAM
E USAM TEU NOME

A SAGA DOS VIVENTES
É REENCONTRAR A PAZ
LONGE DE UM FRANCO
UM FRANCO-ATIRADOR

LIBERDADE AMARGA
LIBERDADE AMADA
VOU PARTIR
COMO QUEM VIVE UM FADO...


CRISTIANO DE OLIVEIRA / ELMO WYSE RODRIGUES

sexta-feira, 3 de agosto de 2018

DE VELAS, LÍRIOS & LINHAS


No desenho do rio
Bafeja meu sentimento
O dialeto da brisa.

Vejo linhas e rostos.

O mergulho das árvores
Águas devolvem em musgos
Conto gravetos nas mãos
Na areia rabisco um desejo.

Ainda existem lírios neste país?

Costuro-me em redes
Lanço-me procura
Versejo toscos pedaços,
Soltos ou não?

Explica-te, estesia...

Volto pegadas de quarteirão
Penso uma analogia
Onde eu possa proteger
O poema disperso,
Que não fuja de mim.

Mas como nativo já foi
Sibila nas velas o vento
Um abraço intangível
Não pode ser feito de algodão.

E.W.R.

terça-feira, 31 de julho de 2018

MIGUEL ROSSETO!!!


Mas é claro que o meu voto a governador, aqui no Estado, vai para o Miguel Rosseto (PT). Conheço este companheiro, inclusive pessoalmente, há muitos anos, na esteira do movimento sindical. Tem uma grande visão política. Apoio e aposto!

Elmo Wyse Rodrigues

terça-feira, 17 de julho de 2018

PERGAMINHOS

A caminho,
arando estradas,
sóis, chuvas, moinhos.

Andança,
escrevi na identidade.
Desafio:
eis o meu nome.

Eu existo, pergaminho.


E.W.R.

quarta-feira, 27 de junho de 2018

Longe de tudo / Longe de ti / Longe de mim / Perto de ninguém.




Talvez fale demasiado em vivências, apesar de tecer poucas páginas a respeito do meu passado. Até por acreditar no mundo literário e suas devidas paralelas - reais ou não. E assim  desapareci entre árvores, plantas e flores, conforme relatos familiares. Tinha pouco mais de um ano de idade. Emudecido. Isso ocorreu quando nos mudamos para a casa nova. Me perdi deveras. Sei lá quantas horas demoraram no resgate. Ao me sentir livre das tristes convulsões da primeira infância, atropelei um automóvel veloz. Tentava atravessar, voando, a Santos Dumont. Cinco anos. Desmaiei, de novo. Tivemos a nossa casa completamente cercada para prenderem um homem só. O meu pai foi sequestrado e roubado do convívio familiar. Ainda uma vez, fiquei calado, brincando com soldadinhos de chumbo. Seis anos. O melhor amigo da escola, também com nove anos, foi atropelado por um caminhão. Morreu. Estava na minha casa, trocando gibis. Lembro o cuidado e o carinho da minha mãe. Da atenção de todos os meus irmãos, alguns já se foram. Lembro a segurança que nos passava o pai - embora ele mesmo estivesse em meio a intempéries. Lembro, sim! Principalmente dos tempos bons. Precisa ser desse jeito. Uma infância protegida. Deveria ser pra todos. Guardo com gratidão a única fotografia, em preto e branco, que me restou da época. Talvez traduza no presente uma forte experiência: ter passado exatamente seis anos na psicoterapia. A partir de então, carrego no bolso dois verbos aonde andejo. Racionalizar / Verbalizar.  Gosto de descrever opostos, no entanto, como literatura. Fugas poéticas. Eis  o título-tema do  meu novo livro, Noturno Verbal.  Talvez tenha encontrado uma justificativa plausível para coexistir em letras. Aprendiz de mim. O suficiente para perambular no rol dos anônimos estupefatos e cidadãos anestesiados, porque sobrevivemos milhões.

                                     Elmo Wyse Rodrigues



Duas da manhã. Até que este texto foi rápido, dois dias.



 






Longe de tudo / Longe de ti / Longe de mim / Perto de ninguém.


Talvez fale demasiado em vivências, apesar de tecer poucas páginas a respeito do meu passado. Até por acreditar no mundo literário e suas devidas paralelas - reais ou não. Desapareci entre árvores, plantas e flores. Tinha pouco mais de um ano de idade. Isso ocorreu quando nos mudamos para a casa nova. Me perdi deveras. Sei lá quantas horas demoraram no resgate. Quando me vi livre das tristes convulsões da primeira infância, atropelei um automóvel veloz. Cinco anos. Desmaiei, mais uma vez. Tivemos a nossa casa completamente cercada para prenderem um homem só. O meu pai foi sequestrado e roubado do convívio familiar. Seis anos. O melhor amigo da escola, também com nove anos, foi atropelado por um caminhão. Morreu. Estava na minha casa, trocando gibis. Lembro o cuidado e o carinho da minha mãe. E da atenção de todos os meus irmãos. Lembro a segurança que nos passava o pai - embora ele mesmo estivesse em meio a intempéries. Lembro, sim! Principalmente dos tempos bons. E deve ser desse jeito. Talvez traduza uma forte experiência: ter passado exatamente seis anos na sala de um psicoterapeuta. Gosto de escrever opostos. Fugas poéticas. Eis a origem do título do meu segundo livro. O contrário aconteceu. A partir de então, carrego no bolso dois verbos aonde andejo. Racionalizar / Verbalizar. Uma infância protegida. E assim deve ser pra todos. Guardo com gratidão a única fotografia, em preto e branco, que me restou da época. 
Talvez tenha encontrado uma explicação plausível para coexistir em letras. Aprendiz de mim. O suficiente para perambular entre anônimos estupefatos e cidadãos anestesiados, porque sobrevivemos milhões.

                         Elmo Wyse Rodrigues

quarta-feira, 13 de junho de 2018

CÉUS DE DAMASCO CHEGANDO!!!
 

E foi pelo próprio autor que recebi a importante notícia, emocionante e emocionado. O primeiro disco solo do Leonardo R.Gaubert foi concluído. E quem não conhece ainda o talento do Leonardo vai se surpreender com a qualidade e originalidade do CD. Ele escreve música e canta poesia, ou vice-versa; atesta que essas artes se abraçam na mesma nascente. Harmoniza a simbiose com o lirismo genuíno e rasgado da sua voz. Apesar de jovem, há anos lapida o braço do violão, toca com muita habilidade as notas - mais que cordas, sentimento. Anota versos como um grande artesão. Experimenta melodias sem a angústia de ter a pressa do fácil mercado; por isso tem um cântico belo. Estuda acordes como quem verte o sangue das veias. Não tenho dúvidas, é um grande trabalho, pois já tive o privilégio de conhecer as outras canções. Assim que receber a ficha técnica, vou falar dos músicos que participaram das gravações, da produção e dos técnicos do estúdio. Já sei que o professor Gilberto Oliveira participou com entusiasmo dos takes .Por enquanto, duas amostras do que vem por aí. Saudações à arte que mantém todos nós vivos e com o sentido e a sensação que temos de estar presentes e com a alegria dos olhos, aqui & acolá - não obstante as adversidades do nosso tempo. Se soubermos, felizes, ser o mais, haveremos de saborear o gosto do mundo...

Elmo Wyse Rodrigues


SE NÃO FOR DEMAIS
(Leonardo R. Gaubert)

Se não for demais
Entra nessa porta e busca
o que há
De mim, de nós, de ti.

Se não for em paz
Deixa tudo como
deixamos um tempo
Atrás, como um sopro
do mar.

Quando for frágil demais
Livres, sóbrios, dentro do
silêncio.

E se for a sós
Lembra o vento que te
roubou um beijo
E levou todo o mal de
mim.

Se não for pior
Conta o tempo em que
estivemos longe
Daqui,
Que em teus olhos me vi.

Quando for frágil demais
Livres, sóbrios, dentro do
silêncio.





Leonardo_Se não for demais.

Leonardo_DESNUDO_

Leonardo_Se não for demais.

sexta-feira, 8 de junho de 2018

A LÂMINA DO TEMPO

Pelos quintais do mundo
Com as vestes de outono
Andei todo esse tempo.

Sangrei pelo flagelo,
Torturas e grilhões.

Sangrei na engrenagem
Ferrolhos desse país.

Por ver tanto cipreste
Crescer amargo e triste,
Morte e exílio.

No entanto chega outubro
Taciturno afio o dia.

É cortiça o palácio
É ladeira o palanque
De fornalha é a fome.

A fome é fogueira,
Fogo e madeira.


Poesia: Elmo Wyse Rodrigues
Música: Marco Dziekaniak / Cristiano de Oliveira

sexta-feira, 20 de abril de 2018



DORMES DOURADA


Dormes um sono dourado
Carrego no pulso da tinta
As cores do amor

Descansa teu corpo

Para a fome candente


Dormes  pedaço de ti
Transpassas, alentas,
Fascinas mélico sabor


Sonhas cenas reais
Manifesto-te segredos
Consenso de chamas

Leio-te, sinto, és madrugada
Deito, nascente, no teu colo.




E.W.R

terça-feira, 17 de abril de 2018

MAIS UMA XÍCARA DE CAFÉ



PARA COMEÇAR, reitero a minha posição de escriba, pelo simples fato de relatar, observar, vivenciar e sentir na pele a conjuntura, sem qualquer rigor científico. Admiro muito o trabalho do educador, do núcleo familiar, do cronista, do político, do historiador,  do cientista social. Admiro o manejo, o trabalho, homens e mulheres construindo o algo. Tenho me dedicado mais ao contexto político pela gravidade da situação. Um país em ebulição e sem rumos. Por carrear a cidadania, apresento-me, opinião. Mas repito, e sem a menor presunção, obreiro sem norte, monto versos, quadras, rimas. Foi por necessidade, aprendi sozinho. Gosto de respirar ritmos, cânticos, odes e adentrar os labirintos da metáfora e da sonoridade. Se posso chamar assim, o meu "pecado" foi ler atentamente os "Cadernos do Terceiro Mundo" pela adolescência. Sonho a verdade da América,  a unidade entre  irmãos. Lembro estar demasiado na vidraça de uma cafeteria, sem notícia melhor. Eu entardecia antes do sol, nos conformes de outono. Um estranho se aproxima - achando-me absorto do nada - meus olhos marejados, seus passos em paz. Disse-me para nunca imaginar dias melhores em tempo preciso. A janela que se fecha abriga um aceno futuro. A degustação do café, o encanto do mar, o sopro de um vento que não se espera. Pura poesia. Fiquei presente no intuito. A percepção sincera. Escutar alguém alheio, ao largo da mediocridade. Ele não parecia ter a pressa urbana; nenhum minuto desnecessário ficou.  Nem precisaria. Vida, voz e vez - eu estava precisando conectar. Refazer, pequena implosão  cotidiana. O generoso é a fotografia que negamos, é a raiz que ocultamos. Medo & coragem.  O generoso volve. Talvez sejamos versos.

                                   elmo.

quarta-feira, 28 de março de 2018


                                                           MAGRO
                                        (Nelson Coelho de Castro)

                                Uma dor aqui no peito, magro
                                E uma vontade de cair - né, magro?
                                Por qualquer caminho desses
                                Por qualquer desses caminhos...

                                


                                   
                         SANGRAR ESSES CAMINHOS
                               (Elmo Wyse Rodrigues)                                 
                                  


                                 Por quanto tempo
                                 Sangrar desses caminhos
                                 Marcas do dissabor.

                                 Tivéssemos superado...
                                 Não tem jeito, magro
                                 Melhorar do quê?
                                 Cansei da esgrima
                                 Covardia alheia grassa.

                                 Há uma vontade –, 
                                 Me perder pelos caminhos...

                                 
                                 O desterro quer partir
                                 A memória quer ficar
                                 Desaprendi a saída.

                                 Prossegue, novelo vivo
                                 Vem estender a fibra.
                                 Toma partido e volta.
                                    
                                 Porque se temperança foi
                                 Foi na mudança de estações.


Nelson Coelho de Castro, Fernando Ribeiro, Raul Ellwanger, entre outros cantores e compositores gaúchos (  no Brasil foram milhares de artistas. O maior expoente, sem dúvida é o Chico Buarque) lutaram muito para que voltássemos a ser uma democracia. Eram tempos bem complicados.  Regime militar. Não havia liberdade de expressão. Gosto muito desta música dele. Faço uma leitura de "Magro" - gíria típica dos anos 1970 - no sentido de que chega um momento onde a gente cansa. Mas são momentos. E ele expressa muito bem a angústia da época, todos querendo eleições diretas para presidente. Mas ele ficou, sim. E continuou a divulgar o seu trabalho importante. Bem, por esses caras vou ter sempre muita admiração e respeito.


                                               .



sexta-feira, 23 de março de 2018

 A NUDEZ HUMANA

Eis talvez porquanto
O distrato social 
Acuados no saguão
Porta argamassa degrau
Esquecemos junção
Acabamos extremos
A volúpia insana
Metralhadora diária
Jovem decano por vez
Sombra sobras assombro
Do terceiro mundo
Geramos o submundo
Criaturas na sarjeta
Espreitam as réstias
Aparecemos filme retrô
Poltronas em couro
Cenário lá fora
Resto gasto lastro 
Caninos afiam
A nudez humana
Bestas que somos
Carniça e desdém
Ossos esquentam
Registram os trâmites
As valas comuns

E.W.R.

sexta-feira, 9 de março de 2018

SÓ UM POUQUINHO, QUERIDA
                          

Ela — Temos compromisso, meu bem. 
Ele — Bem antes te avisei, querida.

Ela —Tomaste iogurte, meu bem?
Ele —  Só um pouquinho, querida.


Ele — A cerveja não está gelada?

Ela — Hã?

Ela — A mesma música faz tempo, mudo?

Ele — Claro, querida.

Ela — Não acho o meu batom preferido?

Ele — Hum? 

Ele — Onde foi parar a minha agenda?

Ela — Já procuraste?

Ela — Recitando pro espelho, meu bem?

Ele — Ensaiando, querida.

Ele — Quem vai lavar a louça hoje?

Ela — Tua vez, meu bem.

Ela — Fiquei bem nesta roupa?

Ele — Linda, querida.

Ela — Hoje não ouvi teu celular tocar

Ele — Sabes onde ele foi parar?

Ele — E as minhas chaves?
Ela — No mesmo lugar.


Ela — Estás cuidando a panqueca no forno?
Ele — Panqueca?



Ela —Viste meu anel por aí?

Ele — Só um pouquinho, querida.

Ela —Precisas ir bonitinho assim?

Ele —Calma, querida.

Ele — Ué, este baú não estava no quarto?

Ela —Sim,  troquei semana retrasada.


Ela — Afinal, aonde vamos?
Ele — Não sei, querida.

       
Jaque / Elmo
       
    SÓ UM POUQUINHO, QUERIDA
                          

Ela — Temos compromisso, meu bem. 
Ele — Bem antes te avisei, querida.

Ela —Tomaste iogurte, meu bem?
Ele —  Só um pouquinho, querida.


Ele — A cerveja não está gelada?

Ela — Hã?

Ela — A mesma música faz tempo, mudo?

Ele — Claro, querida.

Ela — Não acho o meu batom preferido?

Ele — Hum? 

Ele — Onde foi parar a minha agenda?

Ela — Já procuraste?

Ela — Recitando pro espelho, meu bem?

Ele — Ensaiando, querida.

Ele — Quem vai lavar a louça hoje?

Ela — Tua vez, meu bem.

Ela — Fiquei bem nesta roupa?

Ele — Linda, querida.

Ela — Hoje não ouvi teu celular tocar

Ele — Sabes onde ele foi parar?

Ele — E as minhas chaves?
Ela — No mesmo lugar.


Ela — Estás cuidando a panqueca no forno?
Ele — Panqueca?


Ela —Viste meu anel por aí?

Ele — Só um pouquinho, querida.

Ela —Precisas ir bonitinho assim?

Ele —Calma, querida.

Ele — Ué, este baú não estava no quarto?

Ela —Sim,  troquei semana retrasada.


Ela — Afinal, aonde vamos?
Ele — Não sei, querida.

        Jaque / Elmo