domingo, 1 de novembro de 2015

ARGELINO

Tens uma história  triste e anônima, homem black do jazz.
Chegaste feito um busto que rola como as rugas das mãos. Vieste por outros braços, de forma casual e simbólica. O teu lugar é infinito lugar. Eu fiz este pacto contigo -  tentar descrever como te sentes. Não precisamos combinar:  ainda carregas  um heróico blue. Por isto pensei nesta modesta elegia.
Cantavas para a burguesia francesa. Eras chamado até de Charlie Parker. Mas te davam um mísero cachê. Te queriam no fraque moderno empestado. Usavam-te em festas e bares. A noite inteira. Por um prato de comida e alguns trocados para o café do amanhã. Batiam  a tua porta, logo após o show terminar particular. Gostavam da música, não da tua gente sofrida. Tinham orgulho da guerra. Estraçalharam tua pátria. Arrogantes, achavam que eras um troféu colonizado.
Nunca perguntavam como estava realmente, por dentro, na alma, o argelino dos guetos de Paris. A tua  família inexistia. Era apenas mais um viúvo das sobras de guerra. No entanto, as mãos africanas que te  moldaram são as mesmas do berço da sabedoria
universal. Liberdade, igualdade, fraternidade. Sim, sabemos bem  dessa farsa. Descansa em paz, argelino.

E.W.R. 

 

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